Uma breve história do mercado de chatbots no Brasil

Temos percebido que o nível de conscientização por parte das empresas que nos procuram para contratar nossas soluções evoluiu muito em pouco tempo.

Dois eventos que participamos em 2019, o Super Bots Experience e a Conferência Bots Brasil, nos fizeram refletir sobre o mercado nacional de chatbots e os processos de consolidação experimentados nos últimos anos. O termo ‘chatbot’ tem sido usado à exaustão atualmente, o que pode nos dar a impressão de que utilizar um robô para atender clientes é algo corriqueiro. No entanto, a familiaridade das empresas e das pessoas com os chatbots é um fenômeno bastante recente, coisa de três anos atrás. Foi quando o Facebook abriu suas ferramentas para o mercado e fez com que o assunto fosse abordado pela mídia com mais frequência. Nesta época, já operávamos há mais de dois anos (a Nama foi fundada em 2014) desenvolvendo ferramentas próprias de inteligência artificial.

Temos percebido que o nível de conscientização por parte das empresas que nos procuram para contratar nossas soluções evoluiu muito em pouco tempo. Elas superaram o uso inicial, apenas de suporte ao consumidor, e hoje utilizam bots para diversos casos, desde automação de processos ao pós-venda. Já provaram o gosto da economia gerada por um bot de suporte, que consegue livrar sua equipe das tarefas mais maçantes e fazer com que o colaborador humano possa se dedicar a ações mais estratégicas. Agora, as empresas querem mais: o próximo passo é ir além de usar a ferramenta apenas para economizar, mas também fazer com que o chatbot protagonize geração de receita e conversão em vendas.

Publicada recentemente, a última edição do Ecossistema Brasileiro de Bots revela que o volume de bots já criados no Brasil mais do que triplicou de um ano para cá: 61 mil chatbots e voicebots, contra 17 mil citados na edição anterior da pesquisa. O tráfego de mensagens também cresceu: 1 bilhão de conversas mensais com bots, atualmente, contra cerca de 800 mil em 2018. Estudo mostrou que a maioria dos desenvolvedores trabalham tanto com bots de texto como com bots de voz – 65% das empresas participantes do estudo. As que trabalham exclusivamente com bots de texto são apenas 32% e, somente com bots de voz, 3%. 

Liderado pelo jornalista Fernando Paiva, o Mobile Time foi um dos primeiros portais a reservar uma editoria específica para cobrir o mercado de chatbots. Mesmo assim, foi somente em 2016 que este assunto começou a despertar o interesse de sua audiência. Com o tema entrando na pauta do dia, em outubro do mesmo ano, o Mobile Time resolveu criar o primeiro evento específico para este mercado: o Bots Experience Day. Nesta época, conta Paiva, a discussão residia em quando os apps seriam totalmente superados pelos chatbots. Não era tão nítida a distinção entre as indicações de uso. Nem mesmo as diferenciações entre o conceito de inteligência artificial e o produto chatbot em si, como é hoje. 

De lá para cá, o Bots Experience não parou de crescer. Teve duas edições em 2017 e, desde 2018, voltou a ser anual, mas passou a ocupar dois dias inteiros de programação de palestras. Com o número de participantes aumentando vertiginosamente, foi preciso saltar de uma sala com dezenas de lugares para ocupar todo um teatro no WTC, em São Paulo (SP), para 500 pessoas e as salas anexas para expositores. Em minha palestra na última edição deste evento, em agosto, perguntei à plateia quem estava ali representando uma empresa, buscando uma solução para dar vazão à alguma demanda ou processo e quem estava ali à procura de possibilidades para que ele próprio pudesse desenvolver um robô de atendimento. E esta segunda categoria de participantes foi a que prevaleceu, um resultado completamente diferente da primeira edição do evento. 

Bati um papo com ele também sobre o mercado brasileiro de bots em si, e Paiva divide seu progresso em uma primeira fase, na qual era necessário quase que catequizar as empresas, e um boom subsequente onde todo mundo queria contratar bots indiscriminadamente, até mesmo para casos de uso que não eram os ideais. Em seguida, ele conta que houve um período até de frustração –  já que as soluções não resolviam, obviamente, todos os problemas das empresas – e que considera estarmos vivendo atualmente em uma era de maturidade, onde as empresas e seus tomadores de decisão finalmente entenderam o funcionamento destas ferramentas, inclusive aceitando o seu tempo de aprendizado e personalizando e incorporando a utilização mais indicada para cada fim.

O mapa ainda indica que há uma expectativa do mercado sobre a abertura do Whatsapp para opções de pagamentos e a tendência de crescimento no uso de bots de voz, seja por telefone ou por assistentes de voz como Alexa, Siri ou Google Assistant.

Sabemos que, apesar da evolução do mercado, a maior parte dos chatbots desenvolvidos no Brasil ainda permanece focada no suporte ao consumidor. No entanto, como dissemos, não faltam funcionalidades para sistemas mais complexos, focados em vendas, RH, automação de processos internos, entre outras funcionalidades. Estas ferramentas com base em inteligência artificial também são essenciais para auxiliar o humano durante o serviço e permitir integrações customizadas aos sistemas corporativos. Conseguimos verificar uma melhora substancial na qualidade do atendimento prestado quando o aprendizado de máquina é combinado com análises da experiência e do desenho conversacional.

Outro evento muito importante para o setor é a Conferência Bots Brasil. Em sua primeira edição, conforme conta um dos fundadores da comunidade, Caio Calado, reuniu 200 pessoas e três expositores. Na última edição, em Setembro último, foram mais de 30 palestrantes em 4 palcos, 450 participantes e 15 patrocinadores, 2 deles internacionais. Hoje, o evento, realizado em São Paulo, se consolidou como a maior conferência latino americana no segmento, organizada por aquela que se tornou a 2ª maior comunidade de pessoas interessadas em bots do mundo: a Chatbots Brasil. Adolfo Melo, product designer da Nama, falou sobre métricas conversacionais durante o evento e nosso estande recebeu centenas de pessoas. 

Conforme observa Caio Calado, cofundador da comunidade e um dos mais atuantes no segmento, hoje a comunidade Chatbots Brasil está batendo a marca de 12 mil pessoas, o que fez com que a inteligência artificial, o machine learning e a possibilidade de desenvolver chatbots atingisse os cérebros de muitos profissionais que não tinham planos de atuar no segmento. Calado aponta que, melhor do que ninguém, o mercado brasileiro de chatbots está orientado a casos de uso: empresas nacionais desenvolveram produtos para indústrias específicas e foram bem sucedidas em entender as necessidades de cada uma delas. 

Ricardo Blumer, também membro participante da comunidade desde seu início comenta o assunto, defendendo que, quando é necessário falar sobre o mercado nacional de chatbots, é preciso dividi-lo em dois eixos principais: técnico e de produto. No técnico, estamos um pouco atrás dos outros países, já que a compreensão em linguagem natural é fator primordial para a evolução nesta esfera e a maioria das plataformas foi construída com base na língua inglesa. No entanto, quando o assunto é o potencial de inovação e a qualidade do desenvolvimento, fazemos acontecer. Blumer acredita que o próximo passo do mercado seja o aprimoramento das interfaces de voz e da complexidade do conteúdo produzido por UX writers. 

Quando começamos a desenvolver bots, não havia esse ambiente. Precisávamos construir do zero a plataforma e os bots para nossos clientes. O caminho que a gente percorreu como desenvolvedor de plataforma foi extremamente importante não apenas no sentido de aprender e validar a solução de forma empírica, mas também de descobrir a melhor forma de desenvolver este sistema, de acordo com tudo o que permeia a realidade brasileira. 

Pietro Bujaldon, assim como eu e Blumer, também empreende no setor e participa do grupo Chatbots Brasil desde o começo e concorda conosco que, no caso dos empreendedores brasileiros, a troca de informações é mais fluida. Entendemos que o mercado é gigantesco e que há espaço para muitos. É como ele diz: sentamos todos em uma mesa de bar e trocamos ideia, compartilhamos experiências, não falamos nomes de clientes em específico, nem revelamos o molho do big mac, mas trocamos muita coisa que nos ajuda mutuamente. Bujaldon acredita que, após a consolidação, os próximos lugares para o qual o mercado caminha envolve fusões e aquisições.

Hoje, como Nama, compreendemos que o mais eficaz é focar no mercado B2B e nos especialistas que atuam nele, construindo ferramentas para automatizar e integrar bots aos sistemas das empresas. Além de ampliar o foco em ferramentas para desenvolvedores. Entendemos que uma operação otimizada com bots de atendimento ou para processos internos está virando commodity e que, em curto espaço de tempo, a inteligência artificial estará integrada de forma intrínseca à qualquer empresa, independentemente do segmento.


Rodrigo Scotti

CEO da Nama, primeira empresa no país a desenvolver uma plataforma proprietária de inteligência artificial para robôs de atendimento.